A tecnologia nômade

Imagine que você possui um pequeno gadget com conexão wi-fi e em qualquer lugar de sua cidade pode se conectar a Internet para obter as mais variadas informações, tais como um mapa para chegar em determinado local ou ainda uma lista para encontrar o telefone daquele maravilhoso disque-pizza que irá matar aquela que está te matando. Bacana não é mesmo?

Este sonho já é realidade em várias cidades do mundo. Em Seul, capital da Coréia do Sul, é impossível sentar-se em um restaurante ou café e não encontrar um jovem com seu laptop ou PDA acessando informações na web. Na mesma linha, Queenstown, uma pequena cidade na ilha sul da Nova Zelândia planeja levantar em breve uma grande rede wi-fi que atenda seus cidadãos em qualquer ponto. Tudo simples, barato e com velocidades estrondosas que deixariam qualquer companhia telefônica nacional envergonhada em vender pacotes de acesso a 256 kbps de velocidade. A geração nômade não deseja somente acesso. É preciso que este seja rápido para que possam acompanhar a galopante mudança da sociedade onde vivem.

Por trás destes projetos está a necessidade de satisfazer tanto o ímpeto pela busca do conhecimento agregador como também o desejo de estar em qualquer lugar conectado ao mundo virtual e aqueles que dele fazem parte, tentando em uma derradeira ação reduzir o vácuo criado pela própria tecnologia. E no rastro destes anseios encontram-se (como sempre) os que aproveitam para gerar um pouco mais de dólares para sí. No final, todos estão “felizes” e satisfeitos com a facilidade do plug-and-play sem o pray. Mas será mesmo que a reza é descartável?

Se tudo isso é maravilhoso aos olhos dos que aqui estão e que fazem parte da turma que deseja acesso acima de tudo, estruturas como estas trazem problemas tão grandes quanto sua abrangência. Não estou falando sobre problemas técnicos ou financeiros, mas sim sociais. Uma das maiores preocupações existentes é a segurança de dados, seja naquilo que trafega nas ondas eletromagnéticas ou ainda nos próprios aparelhos usados para as conexões pois um pequeno deslize pode em pouco tempo virar uma epidemia e tirar todo o sistema do ar, literalmente.

Um dos cenários mais nefastos é o uso de redes de telefonia móvel para o provimento de acesso. Diante de sua maciça utilização aliada com a propagação virótica permitida por sistemas operacionais reconhecidamente vulneráveis a pragas virtuais, um pequeno código enviado por SMS pode facilmente derrubar toda uma rede causando o caos digital para os usuários e a perda financeira incalculável tanto para o governo quanto para a sociedade. Mais vulneráveis que qualquer rede de computadores possuidoras de mecanismos que tentam (e até conseguem) evitar o alastramento do problema, telefones móveis carecem hoje de tecnologia que coíba “atentados cibernéticos”, tornando-os verdadeiras bombas relógio prontas para explodir no próximo “torpedo”.

Mas nem tudo são espinhos. Aproveitando-se da Lei de Conservação da Massa de Lavoisier, empresas do mundo todo começam a pensar em ferramentas que atacam diretamente este ponto em duas principais frentes. A primeira delas é a adoção de sistemas operacionais menos sujeitos a ataques e as “intempéries” das comunicações sem fio. Conjuntamente, o desenvolvimento de aplicativos que reduzam ao mínimo aceitável este cenário de armagedon também são estudados e experimentados para minimizar futuros problemas que certamente virão.

Em outra via, o controle de acesso ao conteúdo é ponto preocupante para muitas nações. Cingapura, a pérola do sudeste asiático, é uma sociedade rígida ao ponto de proibir a entrada e venda no país de goma de mascar. Para ela o perigo não está somente nos códigos maliciosos mas também no conteúdo acessível pelos cidadãos que podem usá-lo de forma não condizente com a legislação vigente. Neste ponto entrarão em ação sistemas dignos de filmes de espionagem que monitoram o acesso de todos os usuários à procura de palavras-chave ou expressões que possam ser perigosas. Alguns leitores irão dizer que estou sendo exagerado ou ainda que isso nunca irá acontecer. Como prudência e canja de galinha não faz mal à ninguém, não custa avisar.

Existe um outro lado desta moeda para aquele que enxerga longe. Grande parte das produtoras de equipamentos móveis já estão migrando para plataformas livres (principalmente Linux) e estão ansiosas pelo desenvolvimento de aplicativos específicos como bloqueadores de mensagens indesejadas, filtros anti-pragas, anti-pornografia e anti qualquer coisa ruim que possa aparecer no éter. Ou seja, um cenário de oportunidades nunca antes visto e com possibilidades gigantescas para quem se aventurar nesta viagem.

Se pensa o leitor que não temos culhão para isso, não se engane. Já existe em nosso país centros de pesquisa e desenvolvimento das empresas de equipamentos de telefonia móvel se aproveitando de nossa profusa capacidade de criação de softwares para equipar seus aparelhos. Uma delas, a Nokia, mantém em solo brasileiro três centros criando aplicações em software livre usadas por sistemas de todo o mundo, mostrando que temos capacidade de fazer tão bem ou melhor que qualquer indiano.

As possibilidades são muitas. A própria Nokia possui um conjunto enorme de informações e plataformas de desenvolvimento livre para aqueles que desejarem. Outra empresa que embarca no mesmo navio é a Openmoko, muito conhecida na Ásia e com parceria com a já conhecida FIC, produtora de equipamentos de computação, também possui ferramentas de desenvolvimento para seus aparelhos e todo um conjunto de documentação acessível por qualquer pessoa. Além delas, Motorola e Sony-Ericsson navegam no mesmo mar.

Agora, resta ao leitor programador a opção de manter-se a margem do processo ou embarcar nele. A primeira opção torna-o usuário. A segunda, criador e, quem sabe, não só com um bom celular no bolso, mas também um bom dinheiro.