Aprenda não só HTML

Há alguns dias encontrei um artigo na rede que convenientemente sumiu do mapa, onde o autor pregava que aprender HTML é bobagem e que desenvolvedores não deveriam perder seu tempo com esta linguagem pois, nos dias de hoje, “construir” (e não desenvolver) um website é algo extremamente fácil com ferramentas RAD (rapid application development) e o conhecimento adquirido com o HTML é inútil.

Confesso que depois de dezessete anos trabalhando com Internet eu não esperava encontrar afirmação tão contundente e equivocada sobre a linguagem HTML. Sendo ela base de toda a rede desde sua criação e tendo sua nova versão (HTML5) poucos anos de vida e um longo caminho a trilhar, afirmar que o aprendizado desta linguagem é inútil, me faz escrever e rebater a visão lá apresentada, afinal, pessoas que estão começando na área de desenvolvimento para web podem seguir o caminho de gazear estas aulas e sentir uma tremenda falta delas em futuro próximo.

Um pouco sobre programação

Programação não é linguagem. Linguagem de programação, como o próprio nome diz, é um conjunto de comandos (linguagem) que, colocados em uma determinada ordem e seguindo certas regras, dão instruções para computadores executarem tarefas (programação). Dessa forma, não importa a linguagem de programação utilizada, ela será usada para receber algo do usuário, processar este algo, dar instruções para o computador e devolver um resultado. Exemplificado: quando um usuário clica em um link num website, ele está enviando para o computador uma solicitação que poderia ser “inicie este vídeo”. A partir deste momento, uma determinada linguagem de programação interpreta esta ordem, a processa e devolve como resultado o vídeo sendo iniciado.

Com o exemplo é fácil entender que não importa a linguagem que está sendo utilizada para receber as instruções, processá-las e devolver um resultado, pois a escolha da linguagem depende de diversos fatores que vão desde a arquitetura do hardware utilizado até a capacidade da linguagem de entender as solicitações do usuário devolver a solicitação resolvida.

Mas o que esta teoria tem com o HTML? Muito, tenha certeza.

HTML; a web

A linguagem de marcação HTML é usada por todos os websites na Internet, independente do tamanho, conteúdo ou localização geográfica. Mesmo depois da criação de diversas outras linguagens de programação e/ou marcação, a HTML continua sendo a base da rede e aquilo que o navegador (o browser) interpreta para apresentar uma página web. Numa analogia, a linguagem HTML está tão atrelada a Internet quanto a farinha está com o pão, não sendo possível viver sem esta linguagem (e desconhecê-la) na rede, exceto se deseja estar fora dela. Assim, afirmar que aprender HTML é bobagem me faz pensar se a farinha usada para fazer pão também é uma bobagem pois, como dito, não é possível ter um sem o outro.

É certo que alguns podem questionar esta ideia e dizer que com as ferramentas hoje existentes para a criação de páginas web, o aprendizado da HTML não é mais necessário, argumentando inclusive que para dirigir um carro, não é necessário saber mecânica automotiva. Este é um erro clássico daqueles que, seja por falta de aptidão, por falta de vontade ou até mesmo por indicações equivocadas de terceiros (como é o caso do citado artigo), deixam de reter algum conhecimento mesmo que básico sobre alguma coisa, e perdem grandes oportunidades de trabalho ou saem de situações constrangedoras ou extenuantes.

Aproveitando o argumento acima, um motorista realmente não precisa saber mecânica para dirigir um veículo. Entretanto ter uma noção mesmo que vaga, sobre o funcionamento de um carro pode muitas vezes auxiliá-lo a sanar problemas que surgem em seu dia a dia no trânsito das cidades ou ainda em uma viagem. Em caso de uma pane, saber identificar se ela é mecânica ou elétrica ou até mesmo que a bateria não está sendo carregada porque a correia do alternador está quebrada, é uma informação importante na hora de chamar o reboque e muito melhor do que simplesmente dizer “meu carro parou”.

O mesmo exemplo serve para os profissionais de web ou para aqueles que desejam se tornar um. Pode ser que você por motivos de aptidão, não se torne um programador, somente trabalhe com a área de criação (design) e nunca precise colocar seus preciosos dedos criativos em um código. Mas conhecer o mínimo que seja é importante e poderá fazer uma grande diferença em algumas situações. O mesmo é válido para aqueles profissionais que trabalho com SEO e otimização. Muitas atividades dessas áreas estão relacionadas com a leitura e interpretação de um código HTML no intuito de verificar as melhores formas de otimizar um website ou melhorar seu posicionamento em sistemas de busca.

Mas eu sou web designer, preciso mesmo aprender HTML?

Antes de mais nada é preciso conceituar o que é um web designer pois boa parte do erro está nesta conceituação.

Web designer é aquela pessoa capacitada a criar designs para a Internet. Da mesma forma que existem designers de interiores, designers de moda, designers de jóias e tantos outros, o web designer (ou designer para Internet) e também um profissional que cuida do visual de um website, da tipografia usada, da disposição dos elementos dentro de uma página e assim por diante.

Como a área de web design é multidisciplinar, convenciona-se que este profissional deve ser versado não somente em teoria das cores e tipografia, mas também em arquitetura de informação, usabilidade, programação e até mesmo semiótica. Convenhamos, é muito para uma pessoa só pois conhecer a fundo de arquitetura de informação e tipografia é algo para poucos e uma das pontas certamente ficará fraca.

IMHO, web designer é aquele que realmente, e somente, faz design; ou seja, consegue pegar uma ideia e convertê-la para algo gráfico com o uso de cores, fontes, imagens e elementos harmonizados e atrativos para quem vê. Para o restante existem profissionais dedicados às funções “acessórias”; usabilidade, arquitetura de informação, conteúdo e etc, que trabalham em uma equipe multidisciplinar com o objetivo de produzir o melhor produto final possível (e por isso grandes empresas possuem estas pessoas e estas posições em seus quadros). Este profissional chamado por mim de “web design” até poderia deixar de lado o aprendizado de HTML, mas compreender a dificuldade que existe na criação de certas peripécias em um design para Internet irá, no mínimo, minimizar a quantidade de palavrões dirigidos à sua genitora.

Infelizmente o mundo não é tão bonito como alguns designers desejam e nem sempre o profissional trabalhará em uma empresa que possuem as funções bem definidas e que indicam quem faz o quê. Como isso é fato, conhecer HTML (e não somente HTML) é condição sine qua non para os web designers, mesmo para aqueles que usam as ferramentas RAD de hoje em dia.

E os CMS’s?

Ferramentas de CMS (content management systems) são quase duas mãos na roda para quem desenvolve para Internet. Drupal, Joomla!, WordPress, SharePoint, etc, permitem funções que antigamente precisavam ser programadas do zero, possam hoje ser adicionadas em um website em questão de minutos. Isso vale até mesmo para as mais complexas como um sistema de comércio eletrônico ou diretório de serviços.

Isso não quer dizer que elas sejam a salvação da lavoura ou a última garrafa d’água do deserto. Longe disso, elas precisam também de profissionais gabaritados e proficientes nas mesmas pois o nível de facilidade que elas proporcionam é também o nível de facilidade permitido para se cometer erros. E mais uma vez, com elas, também é necessário conhecer a HTML, bem como outras linguagens (e muitas vezes até mesmo aquela na qual o CMS foi criado) pois o CMS “per se” faz muito, mas ainda não opera milagres (estes é o programador que irá fazer com a ajuda do CMS).

Então, o que fazer?

Conhecimento nunca é demais, não pesa em sua cabeça e não lhe será roubado. Por isso e por muitos outros motivos, além daqueles que lhe incitam a ser um bom profissional de Internet, o aprendizado da HTML e de outras linguagens que trabalham em conjunto com ela (CSS, JavaScript, XML, etc.) devem fazer parte de seus objetivos profissionais a curto e longo prazo. Para este aprendizado existem diversas opções que vão desde cursos pagos até websites com tutoriais, vídeos e podcasts gratuitos. Opções não faltam, basta somente querer.

Se irá usar o conhecimento, quem sabe? Eu aprendi há vinte e cinco anos atrás o código fonético internacional usado em comunicações e mesmo hoje, vez em quando, uso-o para informar localizador de passagens no telefone às atendentes de companhias aéreas (que insistem em sumir com minhas reservas) e facilitar suas vidas e a minha. Para elas é muito mais fácil entender um “alfa charlie papa cinco tango” do que ACP5T, além de ser um código internacional usado em todos os idiomas e países. Nunca pensei em usar este conhecimento mas aí está ele sendo empregado volta e meia em minha vida. O mesmo aconteceu com a HTML que aprendi na época do NCSA Mosaic; até hoje os conceitos lá aprendidos são utilizados. Podem estar obsoletos por causa da evolução mas longe de serem inúteis ou bobagens.

4 comentário em “Aprenda não só HTML

  1. Alessandro Raniere

    Paulino,

    O tal site contém este desincentivo ao aprendizado do HTML pois fatura uma boa grana com os banners de publicidade daqueles construtores de site online. Simplesmente precisam fortalecer o produto pra gerar mais vendas. Money.

    1. Paulino Michelazzo

      Olá Francisco,
      Com certeza existe. Mas o pior não são as bobagens e sim continuar a afirmar a bobagem.

      Abraços e volte sempre.

  2. Diego Walisson

    O grande dilema para quem vai iniciar uma carreira (qualquer que seja, não só em T.I.) e precisa aprender determinado tópico é este: quais referências escolher. Sempre me pautei em aprender nos ombros dos gigantes, acho que é o mínimo que deve-se levar em consideração. Deve-se ter bom senso.
    Ex: depois que assisti a uma palestra do Paulino aqui no MA, não deixei mais de assinar seu RSS (sem querer puxar o saco! rsrs).

Comentários encerrados.