LinuxWorld São Paulo

Um relato pessoal da versão paulistana da maior feira mundial de produtos e serviços sobre Linux.

Se você faz parte da comunidade de software livre e não suporta “business”, pare a leitura aqui mesmo. A LinuxWorld é somente isso: business. Nada de hackers sentados ou deitados nos corredores suntuosos de um hotel cinco estrelas com seus notebooks cheios de adesivos, nada de grupos de usuários fervorosos com bandeiras de suas distros favoritas, nada de camisetas com frases contra a Microsoft, RIAA ou patentes e transgênicos. O ambiente é outro, totalmente diferente daquilo que a comunidade está acostumada a encontrar nos eventos de software livre espalhados pelo país. Ruim? De forma nenhuma, somente uma outra visão.

Minha participação
Aproveitei minha estada na fria capital paulista para participar do último dia da primeira edição da LinuxWorld Expo realizada no Grand Hotel Meliá WTC na zona sul da cidade. Um ambiente que colocaria muito “nerd” de plantão com os cabelos em pé. Já sabia o que encontraria no evento: alguns amigos da comunidade vestidos de terno e gravata (algo interessante para quem está aconstumado a vê-los de jeans e camiseta) e vários executivos e técnicos que lá estavam com o intuito de simplesmente saber “como reduzir custos”. Nada mais que isso. Ideologia é algo que fica da porta para fora aqui. Estamos falando de negócios, de business e não de ideologia (que comento algumas passagens interessantes logo mais).

Minha participação tinha dois objetivos principais: primeiro, fazer contatos com pessoas e empresas para participarem e patrocinarem o II ENSOL que será realizado em João Pessoa ano que vem e segundo, rever alguns amigos e contatos comerciais que possuo na cidade.

Para o primeiro creio que fui bem sucedido, principalmente pela confirmação da participação de Jon maddog Hall e do LPI no II ENSOL e também do interesse de algumas empresas no patrocínio. Para o segundo, faltaram algumas pessoas mas assim mesmo lá estavam Douglas e Dionara Conrad (o casal 20), Ricardo Bimbo (quanto tempo!), Lozano, Faw, André, Octávio, Hélio, Sulamita (a nerd mais exuberante da feira), Pacheco (Mr.OOO), David e alguns outros. Incomparável com qualquer evento “nosso” onde toda a trupe está reunida, mas certamente interessante reencontrá-los, principalmente para colocar os fuxicos em dia.

O evento
Participei somente do último dia (quinta-feira) por motivos pessoais. Mas acredito que o relatado aqui não difere muito para os outros dias, levando em conta principalmente as conversas que tive com várias pessoas tanto da comunidade como de empresas. Então, vamos lá.

Infra-estrutura
Não sei se faria um evento de comunidade dentro de um hotel. Parece-me um ambiente por demais sóbrio e “certinho” para aqueles que defendem a liberdade. A começar pela proibição de não fumar dentro da feira (o que obviamente foi esquecida em vários momentos) e também por não comportar efetivamente toda a galera. Além disso, para conseguir uma bendita garrafa d’água era preciso mendingar em algum estande de empresa pois não existiam bebedouros ou qualquer coisa do tipo, somente “coffe-break” em alguns horários do dia (evento de Linux com coffe-break é algo interessante). Também senti falta de wireless. As redes que existiam eram fechadas e pagas e a única opção era brigar por um desktop qualquer dentro de um estande e ter que aguentar as “linuxetes” com seus folders e pastinhas engolindo em seco a vontade de dizer: “ei, isso ai eu ajudei a fazer”. Mas qual não foi a minha surpresa quando liguei meu “tec-toy” e tive a grata visão de uma rede aberta com o ESSID “debian”. Certamente Faw e André colocaram um AP no estande e com isso pude acessar a web por algum tempo (obrigado meninos!).

O local é pequeno mas para a primeira edição, comportou bem o povo que lá estava. A única coisa que me impressionou foi o auditório principal com dois telões, uma baita tela LCD na frente do pórtico do palestrante (assim não precisa se contorcer para ver o que está passando no telão), um som de primeira linha e, creio eu, 500 poltronas confortavelmente dispostas. Acho que é a única coisa que gostaria de ter no ENSOL é um espaço desses 🙂

Palestras
Muitos reclamaram das palestras e pelo que vi e senti, foram poucas que estavam cheias. Não que os palestrantes fossem ruins, mas acho que os temas foram deslocados para o tipo de evento. CIO e CFO não querem saber tecnicidade de uma distribuição ou solução. Querem realmente saber é quanto irão reduzir em seus budgets de TI, preferencialmente com números grandes (e beeeemmmmm grandes). Nisso, muitos dos palestrantes, seja por falta de conhecimento do meio ou ainda por falta de tato, pecaram em apresentar soberbamente as especificações técnicas mas com números de redução obscuros. Isso fez com que o desinteresse ficasse estampado tanto nas pessoas quanto nos números de participantes das palestras.

Mas é claro que não foram todas. Maddog e Bill (Microsoft) tiveram casa cheia como era esperado e pelo que constatei, todos os “keynotes” tiveram casa cheia (inclusive por não existirem palestras paralelas). As demais, algumas interessantes e outras nem tanto. Coisas de evento “business”.

Feira
Aquela coisa de evento comercial: brindes, gravatas, ternos, mocinhas estonteantes de belas (que não estavam em roupas sumárias certamente devido ao frio de 14 graus em SP), folders, pastas, cartões e tudo mais que vemos nestes eventos. De interessante: Red Hat com um baita estande (o que não é comum, pelo menos aqui), Novell com uma máquina esdrúxula de rápida (vinda diretamente sabe Deus de onde, obra de meu amigo Santo do Nascimento) e seu novo desktop SuSE (muito legal mas ainda fico com meu Ubuntu), IBM com as coisas de sempre e mais um monte de pequenos mas tão bons quanto. Dentre eles, A Casa do Linux, AW2NET, a 4Linux e outras que não conhecia ainda.

Bom foi ver a Debian com um estande (ganharam, creio eu), o BR.Office (Pacheco, onde arrumou a guria?) e também a Solis do meu amigo César Brod. De uma forma ou de outra, a comunidade coloca seu pezinho dentro do corporativo e mostra também que sabem fazer negócios. Não são todos, claro, mas alguns já alçam vôos interessantes como é o caso da OpenS que mesmo sem estande, fazia barulho (como sempre).

Novidade? Nenhuma para mim. Para alguns outros sim, muitas novidades. Tentaram me mostrar a última palavra em VoIP com uma ferramenta chamada Communigate (ou coisa do tipo). Confesso que fiquei decepcionado porque pensei ela permitir contato com a Lua e também fazer com que meu carro andasse sozinho. Fora isso, o que ela tem para mim é trivial, inclusive já tendo usado na rede da Cobra Tecnologia em Brasília. O resto, desktops com efeitos de vira-prá-cá-vira-prá-lá, alguns produtos desenvolvidos “at home” e só.

Mas…. claro, tinha que ter algo interessante em outro sentido. Conversando com uma empresa argentina chamada Pixart (http://www.pixartargentina.com.ar), me apresentaram um produto chamado Rxart que é uma “distro” Linux com várias ferramentas para facilitar a vida do usuário. Duas coisas me deixaram boquiabertos neste produto: primeiro, a velocidade de processamento é simplesmente impressionante. Efeitos de vídeo eram executados tão rápido quanto um piscar de olhos. A segunda é certamente triste e intrigante: o produto é fechado (inclusive me falaram na cara que “no haciemos software libre, pero abierto”) mas ali dentro certamente existem dezenas de bibliotecas e outros códigos que são GPL mas que estão sendo fechados pela empresa. Algo que a FSFLA deve se preocupar, inclusive por estar acontecendo no país sede da fundação e na cara de um dos principais diretores, Federico Heinz.

Resultados
Conversei longamente com Maddog sobre dezenas de assuntos. Sempre que posso, tiro um tempo para me atualizar com ele e ouvir seus pensamentos e ponderações certeiras sobre o mundo do software livre. Para mim, mais que um ídolo, é um amigo que procuro sempre que uma dúvida sobre algum ponto nebuloso aparece e que com ele tenho certeza conseguir resolver. Não sei se devido a seus cabelos e barba brancos, reflexo de anos de experiência, ou pelo seu jeitão paternal, Maddog é certamente aquele que consegue com mais destreza caminhar nos dois lados da linha. E em uma conversa, perguntei o que tinha achado desta primeira edição do evento e ele foi enfático a dizer: “muito boa e melhor que, por exemplo, a LinuxWorld do México. Vi que muitos negócios começaram aqui e certamente darão frutos para as empresas muito em breve”. Vindo de quem vem, é um prognóstico interessante.

Além disso, conversando com outras empresas (principalmente as pequenas) a percepção foi que valeu o investimento feito para lá estar. Somente uma das mais próximas a mim estava com vários prospects em várias áreas e também outras empresas contentes com o resultados obtidos. Certamente que prospect não é sinônimo de grana em caixa, mas assim mesmo, é o primeiro passo para lá chegar.

E a comunidade?
Penso que ela perde em dois aspectos principais: não estar presente por não saber falar o “businessês” necessário para um ambiente como este e também porque lá pode ser visto o que o business é realmente: business. Como dito anteriormente, a ideologia fica da porta para fora a fim de não atrapalhar os negócios. Um processo complexo de adaptação daqueles que desenvolvem e criam com este mundo e vice-versa. Mas, ao mesmo tempo, algumas coisas me foram sinalizadas. Por exemplo, a Novell hoje parece-me ainda perdida dentro do mundo Linux. Mais ou menos como ter um filho e perguntar: onde está o manual de instruções??? Mudaram a visão, mudaram o foco mas ainda não sabem bem como interagir com o outro lado que é a comunidade. No meu ponto de vista, uma oportunidade ímpar de nos ajudarmos para que posamos manter um software tão livre quanto ele é, gerando dividendos.

Finalizando
Foi interessante em todos os aspectos (principalmente o happy hour depois do evento no “Princesinha” com a participação de vários nerds que lá estavam). Bons contatos para meu trabalho, dirimi algumas dúvidas de pessoas quanto a questão do Mambo/Joomla (sempre ela), revi amigos e fiz alguns novos. Mas, pessoalmente, ainda prefiro nossos eventos (que não quer dizer que ficarei de fora no próximo ano).